Pesquisar este blog

quinta-feira, 5 de maio de 2011

ANDERSON SILVA x MIKE TYSON

Antes que ocorra qualquer confusão, nem no sentido intelectual e muito menos no sentido físico, não estou propondo ou antecipando mais uma luta do século. Para quem acompanha artes marciais ou boxe, muitos foram os combates assim classificados, lugar comum superutilizado no meio esportivo para promover diversos tipos de eventos. O que avaliaremos a seguir transcende a disputa esportiva direta entre esses dois lutadores que já entraram para a história de seus respectivos esportes. Convido-os, muito pelo contrário, a avaliar a similaridade de suas trajetórias e eventuais diferenças, tudo inserido no contexto maior do negócio em que estão envoltos.

Fui testemunha ocular do fenômeno Mike Tyson. Garoto com talento nato para o boxe foi como muitos outros, retirado de uma vida fadada ao crime para destilar todo o seu ódio contra as injustiças que vivenciou ou até mesmo sofreu na pele no corpo dos adversários destinados a ele no ringue. No início, como todo lutador com potencial, pegou lutas que se ofereceram para seu crescimento no ranking, algumas de tão fáceis que viraram até folclore – me lembro especialmente de uma em que bastou a ele pegar o tempo exato em que o adversário ficava pulando a sua frente para, com um único golpe, nocauteá-lo.

Mike Tyson


Após duas dezenas de lutas estava ele próximo de se tornar o mais novo campeão dos pesos pesados. Em 1986 vencia Trevor Berbick, por nocaute, no segundo assalto, e assombrava o mundo. Porém, a miríade de organizações mundiais de boxe e seus empresários, num meio esportivo que sempre foi acusado, não sem razão, de explorar suas estrelas ao máximo, incluindo emocionalmente, tal qual alguns jogadores de futebol no Brasil, a fama e o dinheiro fizeram estragos. Numa entrevista muito franca, realizada no meio do ano de 2010 para a revisa americana Details, ele detonava aquela carreira que de tão meteórica começou a degringolar apenas 4 anos após seu surgimento de brilho mais intenso, quando foi derrotado por James Buster Douglas, numa luta realizada em Tóquio:

- A primeira fase da minha vida foi um monte de egoísmo. Só um monte de presentes para mim mesmo e para pessoas que não necessariamente mereciam. Agora estou com 44 anos e percebo que toda minha vida é um lixo. "Maior homem do planeta"? Eu não era nem metade do homem que pensava ser. Então, se há algum grande plano agora, é apenas dar. É altruísmo, importar-me com pessoas que merecem. Porque acho que sou um canalha. Tenho esta incrível capacidade de me olhar no espelho e dizer "Sou um canalha. Sou um m...". http://globoesporte.globo.com/lutas/noticia/2010/07/mike-tyson-desabafa-sou-um-m.html - acessado em 27/Fev/2011.

No auge de sua carreira era comum ver pessoas acordadas até de madrugada para assistir suas lutas, que muitas vezes não passavam do primeiro round. Tal aspecto me alertou para a similaridade com o atual monstro dos ringues da Mixed Martial Arts (MMA), o brasileiro Anderson Silva. Passei então a avaliar se o fim seria o mesmo, ou se o passado histórico de alguém como Tyson poderia ter trazido algum aprendizado num meio também dedicado às lutas.

Diferentemente do boxe profissional dos anos 80, o MMA, por intermédio do Ultimate Fighting Championship (UFC) vem trilhando um caminho pela unificação das lutas. Como alcançou isto seria matéria para um outro post, mas em resumo minha tese se baseia que com força financeira e um mínimo de inteligência para a venda de uma imagem e de um produto se consegue superar quaisquer obstáculos em torno de uma supremacia em termos de credibilidade organizacional. E isto foi feito e vem transformando o MMA numa máquina de fazer dinheiro. Seria muito fácil, pois, para qualquer um que estivesse envolvido nesse meio se perder como Tyson o fez. Porém Anderson Silva, para minha surpresa – também sou preso a alguns estereótipos quando transito por mares os quais não estou habituado – demonstrou clareza e consciência quanto aos seus limites em uma série de entrevistas que vi dar ultimamente – a maior parte delas para o programa Sensei Sportv, especializado em lutas.

Em diferentes momentos ele afirmou, categoricamente, que não é imbatível e que os cinturões que possui podem a qualquer momento ser conquistados por outro lutador. Indicou ainda ter a preocupação com a mensagem que passa para o público, sendo o melhor caminho pregar a humildade sempre e ajudar os outros sempre que for preciso. Essa humildade, que uma vez esquecida quando enfrentou Demien Maia em Abu Dhabi e que gerou uma série de protestos não somente de seu empregador, mas de todo o público que acompanha o MMA, fez com que ele colocasse novamente as coisas em seu devido rumo: “Não foi uma atitude legal. Entrei no clima da luta, da rivalidade e acabei extrapolando um pouco. Poderia ter sido mais sério, com certeza”. A atitude de clarividência quanto aos próprios limites, quer sejam profissionais quer sejam humanos, podem fazer com que seu caminhar seja distinto quando se aposentar.

É o que esperamos de um ídolo brasileiro, que ele contribua para que a humanidade entenda que alguns valores estão acima dos aspectos materiais e que devem ser preservados, em especial o respeito pelo outro. E tal comportamento tem que estar expresso nas mínimas atitudes, tal como quando do retorno ao Brasil após a recente vitória sobre Vitor Belfort, conforme relatado pela Folha:

A chegada ao Brasil, no último dia 13, marcou Anderson Silva com um episódio que ele vem contando desde então. Ao entrar em sua casa, em um condomínio na Barra da Tijuca, no Rio, viu um paparazzo em cima do muro, tirando fotos. "Eu disse: 'Que p... é essa? Velho, tu vai cair daí! Quer foto, a gente tira'."

Se esta atitude é da boca para fora ou não, se este preocupação para com o outro é verdadeira ou não, é outra discussão. Se for somente mídia, se perderá com o tempo. Resta-nos acompanhar e torcer pelo contrário, que esta seja a postura verdadeira dele, passando uma mensagem sólida que permanecerá de pé com o tempo, diferentemente dos seus adversários.

OBS.: Peço perdão pelos palavrões, mas não tinha como tratar deste assunto sem ser fidedigno ao cenário.

Sites acessados (27/Fev/2011):


2 comentários:

  1. Leopoldo, enxergo semelhanças também entre o Anderson e o Muhammad Ali no quesito "show man". Ambos sabem lidar com seus fãs e com as platéias e colocá-las a seu favor. Tyson foi realmente mal orientado e creio que, no seu auge, poucos teriam coragem de encará-lo frente a frente. O boxe e as demais artes marciais são vistas por muitos apenas como sinônimo de violência, mas creio que vai concordar comigo que não são. O que me comove nas lutas é o drama humano (em algumas ocasiões, também social e político) por trás de cada luta e a forma como a inteligência e a estratégia podem vencer a força bruta. Foi o que aconteceu na luta Anderosn Silva x Chael Sonnen, a mais espetacular deste grande campeão. Recomendo o genial documentário "Quando Éramos Reis" sobre a luta Ali x Foreman, disputada no Zaire, se não me engano em 1974. Em termos de filmes, "Touro Indomável" é imperdível!

    ResponderExcluir
  2. Tive em Tyson também um grande ídolo e tenho até hoje todas as suas lutas, inclusive as derrotas, gravadas em velhas fitas de VHS. Sei bem o que era ficar acordado horas assistindo intermináveis lutas preliminares, narradas por Luciano do Vale, com comentários de Newton Campos para, depois, em poucos segundos ou minutos, a luta acabar..rs. Mas depois passei a assistir as lutas de Ali e ele se tornou a maior referência para mim no boxe, principalmente por sua importância política e estilo único e original de "lutador bailarino". Sugar Ray Leonard também foi espetacular! Tenho também os VHS dos desafios dos Gracies com a galera da luta livre (Hugo Duarte, Eugênio Tadeu etc) nos anos 80, época em que os brasileiros ainda não haviam despertado para o profissionalismo e saíam às bordoadas pelas ruas do Rio, onde se cruzassem!

    ResponderExcluir