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quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

O TEMPO

Vez por outra nos deparamos em relembrar os tempos passados e a imaginar os tempos futuros, e apenas administramos o tempo presente. Buscamos no nosso interior o poder de prolongar os momentos de felicidade e de apressar os momentos de tristeza, sem apurar a necessidade de simplesmente senti-los em sua plenitude.

O tema do controle do tempo volta e meia retorna, como sendo uma ambição suprema da humanidade. Fala-se em elixires da juventude, identificam-se novos métodos e cirurgias plásticas, adotam-se modelos de dietas e exercícios físicos em sua maior parte buscando atender um ego estético que cultivamos minuto a minuto, como se quiséssemos derrotar algo que está além de nossas forças.

Existem locais, porém, em que verdadeiramente nos sentimos parados no tempo, tal qual a Shangri-lá decantada no romance de James Hilton, datado da década de 30 do século passado, “O Horizonte Perdido” – Ed. Círculo do Livro, São Paulo – 254 págs.. Shangri-lá era uma cidade em que as pessoas não envelheciam, e viviam sua sabedoria com paciência, desfrutando de cada momento.

Aqui no Brasil poderíamos pinçar diversos exemplos disto. Tive contato com um deles por três vezes nos últimos anos: Conservatória, no interior do Estado do Rio de Janeiro. Aglomerado urbano que viveu seu auge no ciclo do café, hoje vive da fama de ser a “cidade das serenatas”. Composta, em seu núcleo central, por duas ruas principais apenas, sente-se no ar o seu ritmo mais vagaroso em saborear o passar do tempo. Tem como principal atrativo turístico uma série de pousadas e hotéis fazenda que sugerem os mais distintos tipos de lazer, desde os mais agitados, em que se podem curtir gincanas e brincadeiras que mais agradam às crianças que aos adultos, como também se podem encontrar estabelecimentos que têm como principal ambição apenas o descanso integral, o lagartear ao sol sem nada mais fazer, à beira da piscina.

Algo em comum é a dificuldade, por incrível que pareça, de acesso à internet e ao contato via celular. Identificar um ponto onde a banda larga funcione a contento é uma pescaria daquelas dignas das feitas em alto mar, muito diferentes dos pesque-pagues que existem por lá. Outro aspecto é a fartura em termos culinários, com todos os empreendimentos buscando superar os dotes caseiros sabidamente reconhecidos em nossas progenitoras maternas.

Na minha última passada por lá, por motivos profissionais, tive a experiência de contato com quatro animais: o cão vira-lata, doido por um colo para se encostar; galos e galinhas, fugindo da chuva e se demonstrando incomodados com a invasão que parecíamos representar ao terreno de sua propriedade; um sapo chamado “Jorge”; e passarinhos que vinham enfeitar as refeições diurnas, quer seja o café-da-manhã ou o almoço, invadindo, de maneira esvoaçante, o restaurante do hotel em que nos encontrávamos.

Cada um deles pareceu dar o seguinte recado: aqui não há necessidade de pressa. O tempo é mais vagaroso, se apresenta como um deleite para ser desfrutado. Isole-se do resto do mundo e curta natureza. Devo confessar, porém, que sou um ser urbano. Já me deparei com aquele questionamento clássico – mar ou montanha? Normalmente opto pelo mar, com uma especial exceção à Petrópolis, cidade que aprendi a admirar.

Digo isto e acrescento ainda – não consigo viver isolado. Estar num lugar em que o celular não funciona de maneira adequada, que a internet vive caindo, e que a TV a Cabo é uma raridade, não combina exatamente com a minha idéia de paraíso. Ainda mais se for acompanhado de mordidas de pernilongo! É fato: o tempo passa a incomodar mais que apaziguar quando estamos com uma coceira braba!!!

Para mais detalhes sobre Conservatória ver:

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

ZEBRA EXISTE?

A recente vitória de um time da República Democrática do Congo – o Mazembe – sobre o todo poderoso Internacional de Porto Alegre, “vencedor de tudo” como gostam de dizer os colorados, foi aclamado por alguns como o maior vexame do futebol nacional e como uma zebra monumental. No que diz respeito ao vexame, levando-se em conta a polaridade de gostos no Rio Grande do Sul – ou se é Grêmio ou se é Inter – debito isto a certo exagero, uma vez que temos inúmeras outras histórias para relatar. Eu mesmo como flamenguista tenho algumas, infelizmente. Ou seja, o torcedor que não tiver um maracanazo nas costas que atire a primeira pedra. Mas torcedor é torcedor, e paixão não se discute, se tolera.

A questão que quero levantar com vocês hoje aqui diz respeito à segunda afirmação, ou melhor dizendo, a um aspecto da sentença de que este resultado teria sido uma zebra monumental. Pergunto-lhes: zebra existe, de fato? Pois lhes digo, para mim não, e já explico.

Na minha ótica o que existe é competência. E este meu corolário, digamos assim, pode ser confirmado ao extremo quando falamos de esportes. Se você enaltece sua equipe e todo o seu trabalho de preparação, esquece-se por vezes que o adversário tem as mesmas intenções e treina tanto quanto para atingir o seu objetivo.

Poder-se-ia argumentar então a questão do talento. Ah, mas o Internacional tinha muito mais talento que o Mazembe.... Tal afirmação tem um caráter relativo, uma vez que pela força do talento dos atacantes africanos eles conseguiram fazer dois gols no time gaúcho. Aí diriam: mas e as falhas dos zagueiros, que não bloquearam os chutes? E aí eu volto ao meu ponto inicial: competência.

Vou me ater apenas ao futebol no raciocínio que apresento a seguir, mas creio piamente que tal pensamento pode ser trasladado para todos os setores. O que existe é a seguinte equação: competência + estratégia bem aplicada = resultado efetivo = vitória. Falando de conceitos. Efetividade = eficiência + eficácia. Eficiência = trabalho bem feito. Pode ser lido como trabalho feito com competência. Eficácia = alcançar o resultado pretendido. Eu acrescentaria, com uma estratégia bem aplicada.

Voltando ao jogo o qual estamos utilizando como exemplo desta minha teoria. Ambos os times se prepararam fisicamente para enfrentar a peleja. Portanto no aspecto fôlego estavam igualados. Já afirmei que talento é um conceito relativo, ou subjetivo, isto é, depende do interlocutor, leia-se torcedor, o que sempre complica o diálogo. Ou seja, vamos “congelar” este dado. Resta-nos então avaliar a estratégia. O Mazembe propôs jogar no contra-ataque, neutralizando os ataques do Inter na medida do possível. Quando o time gaúcho ultrapassava a linha de zaga africana encontrava o competente goleiro Kidiaba (ô nome, um verdadeiro inferno para os atacantes!) impedindo a finalização em gol de seus atacantes.

Enquanto isso, no ataque, as poucas oportunidades que o time congolês teve efetivou-as em gol. Ou seja, pode-se dizer, racionalmente, que o Inter jogou melhor que o Mazembe? O time africano traçou sua estratégia, foi eficiente em sua aplicação e teve eficácia em obter os gols necessários para a sua vitória. A defesa foi melhor que o ataque, poder-se-ia pensar. Mas o ataque do Mazembe não foi melhor que a defesa do Inter?

Assim, deixemos os preconceitos de lado. O time africano mereceu a vitória, e esta não foi uma zebra, foi apenas o resultado de uma ação competente associada a uma estratégia bem aplicada. Mesmo no futebol temos outros exemplos mais longínquos, e para ficar em apenas um, vou citar a seleção da Argentina na Copa de 1990, que eliminou o Brasil no jogo em que este aplicou o seu melhor futebol, mas que não redundou em gol. A Argentina, que só tinha o Maradona – o que já era uma baita vantagem – jogava por uma bola, e foi o que teve. Ou seja, foi efetiva quando precisou. E mais, levou a Copa inteira ultrapassando adversários mais potentes na base das disputas de pênaltis, quando contava com a competência de Goycochea debaixo das traves. Apenas parou na final, quando os mestres da competência futebolística – a Alemanha – mostraram que daquele tipo de jogo eles entendiam mais.

Por último, para vocês não dizerem que eu sou um cético por natureza, como tudo na vida a sorte tem que acompanhar os vencedores. Assim, abro o meu conceito para incluí-la. O imponderável sempre ajudará, mas é impressionante como ajuda muito mais aqueles que trabalham duro, não?

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

BASTARDOS INGLÓRIOS

Depois de uma longa espera finalmente consegui ver “Bastardos Inglórios” (2009), de Quentin Tarantino. O filme sofreu do que chamo “excesso de expectativa”. Isto não é raro de ocorrer sobre os espectadores tardios de um filme de grande sucesso. Os sintomas são bem conhecidos.

Primeiramente, um filme é lançado com grande pompa e circunstância pelas pretensas qualidades que o cercam: um diretor famoso, um astro do cinema – no caso Brad Pitt, em papel que se pretende ir além dos atributos físicos, afinal seu personagem tem uma queixada de fazer inveja ao Mário Gomes – e um tema de recorrente sucesso, desta feita, a Segunda Guerra Mundial e a cruzada antinazista.

Posteriormente, filas se formam, repletas dos fãs de carteirinha do diretor e/ou do ator principal que interpreta o protagonista. E aqueles primeiros espectadores, ao saírem do cinema, justificando e se congratulando pela proeza de terem assistido o filme tão esperado, exaltam suas virtudes, ou com desdém identificam um defeito ou outro, que passa a ser objeto do desejo daqueles que ainda não o assistiram para a sua confirmação ou não.

Quando finalmente então estes espectadores tardios conseguem assistir ao filme, estão eles esperando a suprema obra-prima, uma película que os marcará pelo resto da vida, quer seja por sua alta qualidade ou pelo aspecto mais mesquinho de conseguir apontar defeitos naquele alvo de tantas atenções. O que geralmente ocorre estes mesmos espectadores tardios se desiludem, ou se decepcionam, saindo das salas de cinema como se alguém lhes houvesse passado um engodo.

Em “Bastardos Inglórios”, infelizmente para mim, à parte a excelente atuação de Christoph Waltz no papel do oficial nazista ‘Caçador de Judeus’, o roteiro se demonstra apenas uma pálida representação de violência sem um propósito específico. Este ponto destoa dos demais filmes de Tarantino, em que esta mesma violência representava um papel significativo nas histórias, principalmente como instrumento para fazer a ligação das distintos "contos" paralelos representados na tela. Podemos citar como exemplos máximos desta característica “Pulp Fiction – Tempo de Violência” (1994), “Jackie Brown” (1997) e “Kill Bill” (o qual particularmente exulto a 1ª parte) – 2003/4.

Mesmo o humor sarcástico presente nas obras citadas acima como pano de fundo de cada uma das cenas não encontra igual nível em “Bastardos Inglórios”. Porém, como mérito estilístico, devo dizer que existe algo que está em alta conta neste filme: a tensão permanente pelo que vai acontecer. Como os filmes de Tarantino são reconhecidos pela ação violenta de grande intensidade, não economizando em sangue e closes explícitos – se bem que depois de “Tropa de Elite 1” (2007) isso pode ser relativizado em termos de excelência – a cada take fica-se na espera, em tom crescente, por quando se desencadeará a volúpia sanguinolenta. E o diretor se aprimora em esticar tal ato ao máximo.

Finalmente, talvez o fato que tenha prejudicado o filme tenha sido justamente sua ambientação numa das épocas mais sangrentas da história da humanidade. A Segunda Guerra Mundial, além de já ter sido filmada com distintos olhares, a meu ver atingindo o grau máximo de representatividade em “O Resgate do Soldado Ryan” (1998), de Steven Spielberg, já é por si só uma época que dispensa malabarismos para ser pintada com cores fortes. Na tentativa de dar um toque diferenciado, Tarantino erra a mão no roteiro e caminha por trilhas desnecessárias. Melhor faria ele se buscasse, como já o fez anteriormente, enaltecer personagens do submundo, do que tentar envolver nomes históricos em tramas de frágil estrutura para serem sustentadas.

Enfim, resta-me melhores perspectivas após ter assistido “Tropa de Elite 2”. O Capitão Nascimento, que agora subiu na vida, não deixou que o poder lhe subisse a cabeça e deu seu recado. Mas isso é conversa para outro post.

Sites consultados:

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

A TRILATERAL

Quando começamos a lidar com o dia a dia de uma área internacional em termos profissionais nos vemos inseridos perante um antigo dilema: trabalhar pelo ideal de um mundo melhor ou tentar harmonizar seus anseios perante um cenário conturbado em que muitas vezes não temos idéia das verdadeiras intenções dos atores principais?

É claro que esta não é uma questão com respostas excludentes entre si. É possível se mudar o sistema atuando dentro dele. Algumas vezes é uma batalha até mesmo mais simples, uma vez que as ferramentas se encontrarão sob seu controle, o que é bem diferente de olhar de fora e imaginar o que fazer sem ter como. Porém, algo é extremamente importante em todo esse processo: a consciência do entorno em que se está inserido. E ser consciente é saber fazer escolhas mediante as opções que se apresentam.

Expressa essa filosofia – o que faz com que os especialistas na área das relações internacionais possam seguir em frente sem perder de todo aquela chama da qual se alimentam: ver a sociedade global progredir para um mundo mais equilibrado – passaremos então a verificar uma importante questão, central nos dias de hoje, mas que veio a ganhar contornos concretos a partir da década de 70: como o Brasil se coloca diante da estrutura de poder que se alojou num mundo globalizado?

Essa é a expectativa que está presente em uma obra que em certa vista, levando-se em conta o contexto em que foi lançada – o ano é de 1979 – como panfletária. Estamos falando do livro “A Trilateral: Nova Fase do Capitalismo Mundial” – ASSMAN, Hugo e tal – Petrópolis, RJ – Ed. Vozes – 216 págs. Este livro é a coletânea de uma série de artigos que tem como mote principal analisar a política externa norte-americana do então recente Governo Jimmy Carter e como por trás do discurso de defesa dos direitos humanos se buscava, na verdade, a manutenção do status quo econômico, com a prevalência dos interesses das empresas dos Estados Unidos, unidas às corporações européias e japonesas – por isso o nome Trilateral.

Naquela ocasião tal fato ganhava ares de uma grande e megalomaníaca conspiração mundial, digna dos filmes de espionagem. Grandes cérebros infiltrados nas principais posições de governo maquinavam estratégias no sentido de manipular a opinião pública nos quatro cantos do mundo de modo a buscar o lucro máximo para as multinacionais dos países desenvolvidos. O cenário hoje em dia mudou de tal forma e esse discurso parece incorporado como uma realidade pura e simples do mundo em que vivemos. A pergunta é: teriam dessa forma sido seus arquitetos os grandes vencedores? Teriam eles conseguido o seu intento de efetuar uma “lavagem cerebral” em todos a ponto de que nos acomodemos com a situação que vivemos?

A meu ver não. Isto é uma falácia, um exagero que serve a discursos extremistas. A luta do Governo é constante por fazer prevalecer os interesses nacionais em nossas negociações. Mais ainda: o mundo globalizado de hoje em dia permite ter acesso a um volume tal de informações que dificilmente podemos alegar desconhecimento dos reais interesses presentes do outro lado da mesa.

Mas nada disso seria possível se não houvesse os primeiros alertas em obras como a citada acima. Elas serviram para que os especialistas daquele tempo mantivessem sua guarda alta, buscando oportunidades sem se deixar enganar por discursos politicamente corretos. Dos artigos presente no livro chamo atenção para três, essenciais para a compreensão de sua mensagem:

“O Caso Carter: um Fenômeno Planejado” – Alberto Micheo;
“Da Segurança Nacional ao Trilateralismo” – Arturo Sist e Gregorio Iriarte;
“Os EUA Contra os Direitos Humanos no Terceiro Mundo” – Noam Chomsky e Edward S. Herman

Em que pese o tom raivoso típico das obras de Chomsky, um anticapitalista ferrenho, desta feita ladeado pelo também norte-americano, o economista Edward S. Herman, entendo que o seu artigo serve como fechamento do livro por dar o tom imaginado naquela ocasião pelo editor Hugo Assman, economista brasileiro, militante da Teologia da Libertação (1). Assim, o leitor entende o objetivo da obra e seu viés, não a lerá enganado.

Porém, em termos informativos e históricos e pela penetração ambicionada, ganham relevo, a meu ver os outros dois artigos por mim citados, tendo como autores o cientista político venezuelano Alberto Micheo, assim como os demais latino-americanos Arturo Sist e Gregorio Iriarte. Estes apresentam o panorama de maneira objetiva, trazendo informações sem um apelo demasiado forte ao discurso inflamado. Acredito que, no mundo de hoje, tal abordagem seja mais produtiva, pois ao mesmo tempo em que trás subsídios para uma atuação esclarecida dos representantes dos países em desenvolvimento, alcança um público mais amplo, que já não tolera discursos por demais radicalizados.

A Trilateral hoje em dia é uma realidade. A articulação entre os vértices EUA, Europa e Japão, apresentados no livro em seu começo (falamos de uma obra do final da década de 70) e apenas como perspectiva futura para o cenário internacional, hoje está consolidada (2). Resta a nós saber navegar nesse mundo, de maneira a torná-lo melhor. Para tanto, as cartas estão expostas, então. Saberemos jogar esse jogo, esta é a questão? Que teremos que jogá-lo, se pensamos em ser grandes, para mim não resta dúvida nenhuma.

(1)      “(...) corrente, que poderíamos denominar como "cristianismo da libertação" no começo dos anos 60, quando a Juventude Universitária Católica brasileira (JUC), alimentada pela cultura católica francesa progressista (Emmanuel Mounier e a revista Esprit, o padre Lebret e o movimento "Economia y Humanismo", o Karl Marx do jesuíta J.Y. Calvez), formula por primeira vez, em nome do cristianismo, uma proposta radical de transformação social. Esse movimento se estende depois a outros países do continente e encontra, a partir dos anos 70, uma expressão cultural, política e espiritual na ‘Teologia da Libertação’”. http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=40899 – acessado em 15/Nov/2010.

(2)      O nível de interlocução hoje em dia alcançou tal força que é feito de maneira explícita nos foros internacionais. Como exemplo, podemos citar no campo da Propriedade Intelectual o site oficial que os três escritórios de patentes – norte-americano, europeu e japonês – mantém, traçando objetivos comuns - http://www.trilateral.net/ .

Sites acessados (15/11/10):


sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

MANO MENEZES + DUNGA = MURICY RAMALHO

Passados alguns meses da última Copa do Mundo e da definição do novo técnico da seleção brasileira, aqueles que me acompanham no Facebook sabem qual era a minha preferência: Muricy Ramalho, atual técnico do Fluminense.

Muricy possui como filosofia o trabalho contínuo, a preservação de seus princípios, mas não sem ser flexível o suficiente para tomar decisões que podem beneficiar o grupo, mesmo que não estejam a contento de estrelas do elenco e até mesmo da diretoria do clube ao qual está vinculado. Sua única preocupação é com o resultado a ser alcançado: o(s) título(s), e para isso baliza a escolha de seus jogadores pela meritocracia.

Reflexo disto estão os números: alcançou um tricampeonato brasileiro seguido com o São Paulo, teria sido campeão pelo Internacional de Porto Alegre caso a confusão no campeonato de 2005 não tivesse prejudicado o andamento do mesmo, e no ano passado conduzia o Palmeiras por um bom caminho até faltarem 6 rodadas para o término. Ou seja, é o rei do campeonato por pontos corridos, modelo utilizado somente a partir do início desta década, com (quase) 5 triunfos nesse período.

Todos estes aspectos me levavam a crer que ele seria um bom técnico para a seleção. Imaginava mais ainda, que ele realmente seria a primeira opção, como se confirmou posteriormente – cheguei a postar no Facebook meu contentamento, antes da reviravolta que levou Mano Menezes ao comando da seleção brasileira. Baseava essa minha convicção no fato de que Ricardo Teixeira, presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), sempre pautou por escolher os melhores treinadores em termos de resultado ou então, em momentos de crise, treinadores dispostos a reverter uma filosofia inteira.

Vou exemplificar:

Treinadores Revolução – colocou Sebastião Lazaroni, que implantou o 3-5-2 pela primeira vez na seleção; colocou Paulo Roberto Falcão para fazer uma renovação de valores – foi o primeiro a convocar Cafú; pela primeira vez uma dupla efetiva, com muita experiência de Copas – Parreira-Zagallo, para acabar de vez com o jejum brasileiro que já alcançava 24 anos; colocou Leão para convocar apenas jogadores que atuavam no Brasil (2000-2001); e colocou Dunga para impor linha dura depois da moleza de 2006.

Treinadores Consagrados – repetição Zagallo (1998); repetição dupla Parreira + Zagallo (2006); Wanderley Luxemburgo (1999-2000); Luiz Felipe Scolari (2001-2002).

Dessa forma, a sua escolha sairia do perfil de um dos dois grupos acima. Uma prova de que ele não estava preocupado com o relacionamento com a imprensa foi que sua primeira opção era o Muricy Ramalho, que notoriamente tem tantas dificuldades com o chamado 4º poder quanto teve o seu antecessor, Dunga. Suas vantagens sobre este último, na qualidade de “consagrado” eram: ser um treinador na acepção da palavra, com conhecimento técnico, vivência e capacidade para lidar com um grupo de estrelas. E mais, sem problemas para fazer modificações no grupo caso surgisse uma novidade estupenda. Faria uma revolução – principal demanda para a nova gestão, mas com conhecimento de causa.

Devo dizer ainda que, para finalizar a comparação, mais do que opções táticas – os resultados alcançados durante os últimos 4 anos remetem à qualidade do trabalho – o grande pecado do Dunga foi ter abraçado um grupo sem estar aberto às possíveis novidades. Recentemente Jorginho, seu auxiliar-técnico durante a última Copa, comentou em entrevista concedida ao canal a cabo Sportv que a decisão mais difícil para fechar a lista de convocados foi a de deixar Paulo Henrique Ganso de fora da Copa de 2010. Perdíamos assim uma vantagem em relação aos nossos adversários: qualidade no banco e o fator surpresa. Mas Dunga, e sua filosofia de preservação dos mesmos componentes de um grupo – fator extraído de sua experiência como jogador nas Copas de 1990 e 1994 (nesta última o Parreira teria feito um pacto com o grupo de jogadores – Dunga incluído - que com ele pelejou durante as eliminatórias de 1993), algo natural para quem nunca tinha exercido a função de treinador, fracassou justamente na hora principal, a da escolha final dos jogadores.

Acredito que seleção é momento, e que não devemos permanecer de olhos fechados para as múltiplas possibilidades que o futebol brasileiro nos apresenta cotidianamente. Muricy era o melhor técnico, a melhor opção, não tenho dúvidas. Apenas não foi confirmado por uma ausência de habilidade profissional da própria CBF, que não foi cuidadosa nas negociações nesse sentido – poderia ter aberto mão, por exemplo, para que este acumulasse os cargos – Flu e Seleção - durante este semestre, para somente no ano que vem exigir exclusividade. Resta a Mano Menezes provar que a equação presente no título deste post não é verdadeira, ou seja, que é um técnico tão melhor que a transforme em Mano = Muricy > Dunga. E isso vai além de ser um cara bem educado nas entrevistas.

Site acessado: http://www.cbf.com.br/php/campeoes.php?ct=1 – em 14/Nov/2010